domingo, 7 de julho de 2019

Só eu

Pode ser que eu encontre
a cada dois anos
a cada duas semanas
ou a cada duas horas
um novo amor.
Pode ser que eu ache
paz num abraço forte
num sorriso furado
num papel dobrado
e nos armários de um sobrado.
Talvez eu encontre
as estrelas e a lua
eu mesmo louco na rua
fogueiras e gente de longe
guerras e presos políticos
montes lidos por monges
montes de pedra
de amor e de areia.

Pode ser que eu ache tudo
sem ainda ter me achado bem
nesses dias de só eu e mais ninguém.
Acho o mundo e não me acho
não me encaixo
nem aqui
nem ali.
Pode ser que eu esteja espalhando demais
entregando e esperando demais
o que devia dar de presente a mim mesmo.

Vai que me acho aqui ou ali
depois de ter me amado
e depois de ter me achado em mim.
Vai que uma viagem pelo mundo
dure uma volta na cidade
comigo e só comigo
e tranquilize por horas
uma cabeça que já não parava
e que não vai parar agora
de pensar que amor é mesmo de espalhar
entregar e esperar
e que talvez seja só cortar a própria fila
pra que um dia de só eu e mais ninguém
seja um dia de só eu
e tudo bem.

sexta-feira, 5 de julho de 2019

Hoje

Acordei como se fosse pra cumprir promessa,
Abri os olhos, levantei porque tinha que ir depressa
pra fazer todas as horas, olhar para os mesmos prédios,
encarar os mesmos rostos e sentir o mesmo tédio.
Saí só e saí logo pra tentar a sorte
de hora ou outra ter motivo
pra soltar algum sorriso
e a sorte que chegou forte
trazendo você.

E hoje não deu.

Hoje não deu pra ser só o despertador,
o levantar e ir e seja lá o que for.
Hoje não deu pra cara feia 
e nem pra sentir desespero.
Cê veio um prato de alegria
que quase nem deu pro cheiro.
Hoje não deu pra ninguém, também não deu pro tédio.
Cê chegou com sua emoção e serviu de remédio.
Não deu pro estúpido do trânsito,
pro Timão fora da ponta
pro imprevisto no trabalho,
o monte de zero na conta.
Não deu pra nada, não deu pra ninguém.
Não deu só porque você deu conta.

Foi bom que cê veio. É bom que cê vem.
Pra me ver sorrindo e pra sorrir também. 
E volte sempre, chegue sempre
porque sempre soma
quando chega e a gente fala no mesmo idioma
das pessoas que se somam 
e se amam hoje.

domingo, 30 de setembro de 2018

Relógios

Procuro música que cante de nós
mas sou incapaz de achar voz
de tanto amor e tom errado
que abre a porta e se inconforma 
com cabelo bagunçado.
Não há sombra que ande mais perto
que essa luz que me guia de longe
à loucura de um bando de loucos
e à pureza na paz da manhã de um monge.

Correr não é como correr só.
Mesa vazia não faz comer só.
Faço de mim lar do que é bom.
Na natureza busco meu som.
Acho que isso é dom e que é só seu:
fazer eu sentir em você
parte do que sou eu.

Relógios se voam pro final do dia.
Carros que desesperam até cabeça fria.
Livros se desdobram e dobram às mesas.
Vozes que se surgem às suas maneiras.
Presença se faz com a alma e com vida:
lembrança que alerta a mente distraída.

Não há em voz alguma, em fio de cabelo,
em sombra e em paz, 
em nenhuma dessas rimas,
quem dirá em desespero.
Não há lar pra nós melhor que nosso peito.
Os relógios velozes, carros barulhentos,
livros quase não lidos, vozes e sentimentos
passam todos por nós pra marcar nosso tempo.
E em nós, por nós, nos marcamos. 

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Creme dental

Sorriso manchado
que tira o meu de lado
pra dançar
e deixa sem ar
e mancha por onde passa
a boca que abraça
seu sorriso manchado.

Não brilha como a luz
faz melhor
seduz
e faz brilhar
como estrela maior
meu olhar.

Sinceramente
o mais sincero
sorriso manchado
não pode ser mero
convite pra ficar ao seu lado
nem pouca alegria
nem só poesia
nem tudo.

Fico mudo 
mas não troco
não me leve a mal
esse sorriso manchado
por nenhum da propaganda
de qualquer creme dental.

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Bom, velhinho, Bom Velhinho

Bom,
velhinho,
Bom Velhinho,
vem aí o Natal
e a cidade tá acesa.
Não sei como, 
se o senhor apagou.

Talvez a homenagem, agora,
de nada adiante.
Peço desculpa pela demora.
É que a mesa ficou cheia
das suas sacolas.
E a cabeça ficou cheia
daquilo que o senhor mesmo dizia:
"É melhor comida
que remédio".
E, agora que partiu, que tédio.

A barba branca,
o amor em dar presente
(nem que fosse uma bala)...
Sua história não mente.
Aqui, ausente.
Mas, acredito que seja presente
no céu e pro céu.
Bom, 
velhinho,
Bom Velhinho,
sua história não mente:
de todos, 
o melhor Papai Noel.